segunda-feira, 19 de abril de 2010

"O Recurso Hierárquico Desnecessário, Necessário" - Ac. 11/03/10 do STA

O Acórdão em análise versa sobre uma questão que muito tem feito controvérsia na doutrina e jurisprudência, pois bem, sumariamente passamos a referir os aspectos relevantes do Acordao que nos levam ao exame da imposição ou não do esgotamento das vias administrativas para o acesso à impugnação contenciosa dos actos administrativos.
No Ac. 11/03/10 o TCAN confirma a decisão do TAF de Coimbra: Absolvição do Réu da instancia por considerar irrecorrível o acto do Presidente da Câmara que indeferiu a reclamação. Esta decisão baseia-se no facto da reclamação constituir um meio de impugnação administrativa facultativa apesar do regime regulamentar prever a reclamação. Retira o carácter não obrigatório do Art. 28º nº1 do decreto regulamentar 19ª/04 ("pode apresentar reclamação") e também do facto da reclamação ser dirigida ao autor do acto reclamado não sendo assim um impulso necessário do particular. Daqui, conclui que o acto administrativo dotado de eficácia externa é o acto homologatório, portanto, defende a ininpugnabilidade do acto impugnado, acto de indeferimento da reclamação.
Pela LPTA só eram recorríveis os actos administrativos definitivos e executórios, situação alterada pela revisão constitucional de 1989 com a nova redacção do Art. 268nº4: são recorríveis os actos lesivos de direitos e interesses legítimos dos seus destinatários. O CPTA, Art.51º nº 1 exclui o esgotamento das vias administrativas para se chegar a via contenciosa ou pelo contrario não afasta a reclamação administrativa como meio de abertura do processo contencioso?
STA: Não exclui a impugnação administrativa necessária quando a lei o disser expressamente ou quando se trate de situações anteriores ao CPTA que sejam tidas como necessárias. Pelas leis enunciadas prevê-se a existência de reclamação, no caso em análise à qual se seguiria recurso hierárquico necessário, haverá impugnação administrativa necessária, sendo que o acto impugnado seria o indeferimento de reclamação.
Conclusão da decisão proferida no Ac. sub júdice, impugnação é facultativa salvo nos casos referidos.
Em harmonia com esta decisão jurisprudencial encontramos eco na doutrina, nomeadamente o Prof. Vieira de Andrade, que nos diz que o particular ao impugnar administrativamente tem como efeito a suspensão do prazo de impugnação judicial do acto, o que não significa que o interessado não possa proceder à impugnação contenciosa na pendência da impugnação administrativa, Art. 59º nº4 e nº5 CPTA. Estas disposições levam a concluir que a impugnação administrativa é facultativa, salvo nos casos em que a lei o diga expressa e inequivocamente. Na esteira do Prof. Aroso de Almeida, a questão prende-se com a definitividade vertical do acto administrativo impugnável. O CPTA não exige que os actos administrativos tenham sido objecto de prévia impugnação administrativa para que possam ser objecto de impugnação contenciosa, Art. 59º nº4 e nº5, portanto não é condição que o autor demonstre ter tentado remover o acto considerado ilegal por via extra-judicial. No entanto, a interpretação restritiva do Professor vai no sentido de que o CPTA não tem o alcance de revogar as múltiplas legislações avulsas que prevêem impugnações administrativas necessárias, disposições que só aquando de revogação expressa se consideram extintas. Posição, que podemos ver elencada nos fundamentos de decisão do STA no acórdão em apreço. Em conclusão, só na ausência de lei expressa em sentido contrário devem os actos administrativos ser imediatamente impugnáveis perante os Tribunais administrativos.
Em posição diametralmente oposta, o Prof. Vasco Pereira da Silva, que considera o recurso hierárquico necessário inconstitucional, quer em regras gerais, quer em regras especiais uma vez que colide com princípios constitucionais, tais como o da tutela dos direitos dos particulares Art.268 nº4 CRP. Para o Professor, o legislador veio afastar expressa e inequivocamente a necessidade de recurso hierárquico necessário, Art. 51º nº1 uma vez que os actos do subalterno são da mesma maneira que os actos do superior hierárquico, susceptíveis de preencher as condições previstas do Art. 51º nº 1; igualmente no Art. 59 nº4 através da atribuição do efeito suspensivo do prazo de impugnação contenciosa, este só voltará a correr depois da decisão do seu pedido de reapreciação do acto administrativo; o Art.59º nº5 diz-nos que será sempre possível ao particular aceder de imediato à via contenciosa independentemente de ter ou não feito uso da via graciosa. O Professor vai contra a interpretação restritiva do CPTA feita pelo Prof. Aroso de Almeida, defende que o modo mais correcto de colocação do problema do relacionamento entre as normas do CPA, que permitem o acesso imediato ao juiz sem qualquer condição de utilização previa de vias administrativas e as normas que continuem a prever a existência de garantias administrativas necessárias, não tem a ver com um fenómeno de revogação, mas sim com o da caducidade destas ultimas por falta de objecto. Uma vez que a única razão de exigência do recurso hierárquico necessário era o de permitir o acesso ao juiz, e se agora o CPA estabelece que tal garantia prévia não é mais pressuposto processual de impugnação de actos administrativos então isso só pode significar que a exigência de recurso hierárquico necessário em normas avulsas deixa de ter consequências contenciosas pelo que se deve considerar que tais normas caducam. Caducidade por falta de objecto, que acresce ao fenómeno de inconstitucionalidade da exigência de recurso hierárquico necessário, por violação do conteúdo essencial do direito fundamental de acesso a justiça administrativa.
Portanto, em conclusão a decisão jurisprudencial do acórdão não vai de encontro à posição enunciada pelo Professor Vasco Pereira da Silva.
Na nossa opinião, concluir pela inconstitucionalidade do recurso hirerquico necessário em todas as situações decorrentes de leis especiais, poderá ser um tanto ou quanto excessiva, uma vez que tal pode contribuir para o atrofio dos Tribunais, o acesso desmesurado cada vez que um particular se sentir lesado pela prática de um acto administrativo. Imaginemos, um acto administrativo praticado pelos serviços administrativos de uma faculdade que lançam erroneamente uma nota, não seria exagerado, este particular lançar mão da via contenciosa, podendo encontrar solução através dos meios graciosos????


Joana Pinheiro Teixeira
Andreia Sofia Ferreira
Subturma : 10
 
 

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