sábado, 10 de abril de 2010

Tarefa 2

Tarefa 2 – Procedimento administrativo como processo a um acto ou como processo de partes

Actualmente, o legislador deixou bem claro que os processos do contencioso administrativo são processos de partes, deixando de lado os traumas da infância difícil do direito administrativo em que se previa que o procedimento administrativo era um processo a um acto. Este entendimento surgiu no modelo francês, em que de acordo com a lógica clássica o contencioso administrativo era de tipo objectivo, uma vez que se destinava à mera verificação da legalidade de uma actuação administrativa. Não se reconhecia o direito subjectivo das partes, todo o processo girava em torno do acto administrativo, sem que os interesses e direitos das partes tivessem qualquer importância. Com efeito, nem a Administração nem os particulares eram reconhecidos como sendo partes, apenas serviam para ajudar o tribunal na defesa da legalidade e do interesse público, e, portanto, também não podiam entrar em juízo para defender os seus direitos ou interesses próprios. Isto acontecia também porque não se considerava que houvesse uma relação jurídica entre a Administração e os particulares, ou quando esta era admitida era uma mera relação de poder.

Tendo em conta a concepção Clássica do Direito Administrativo, o particular nem sequer era um sujeito, era um mero “objecto do poder soberano”, um “administrado”, logo não lhe eram reconhecidos direitos subjectivos perante a Administração, pelo que a sua posição num processo não era a de uma parte em sentido material. Este tipo de ideia de que o particular não era parte processual integrava a concepção actocêntrica do Direito Administrativo, que apenas se preocupava com os privilégios autoritários e com as manifestações de poder da Administração, ao mesmo tempo que negava a titularidade de direitos subjectivos aos privados no relacionamento com as autoridades administrativas e que lhe negava também a qualidade de parte no processo contencioso.
Esta concepção de que o particular não estava em juízo para proteger os seus próprios interesses continuou a ser afirmada durante muito tempo, em vários países, inclusive em Portugal, manifestando-se através das concepções objectivistas da Justiça Administrativa.
No entanto, esta doutrina clássica não negava apenas ao particular o estatuto de parte no Contencioso, como também o negava à própria Administração, que estava em juízo como parte recorrida, para auxiliar o tribunal na tarefa de estabelecimento da legalidade e do interesse público. Isto decorria do “pecado original” de promiscuidade entre Administração e Justiça, pois apenas é possível falar de um processo de partes quando o juiz desempenha o papel de um terceiro, em face de dois interesses antagónicos que lhe são apresentados.
Esta promiscuidade que justificava a negação da qualidade de parte às autoridades públicas só foi afastada de vez em Portugal com a Constituição de 1976, que integrou o Contencioso Administrativo no Poder Judicial. No entanto e apesar disso, o legislador continuara a referir-se à Administração como “entidade recorrida” (art. 26º LEPTA).
Actualmente, e num Contencioso plenamente jurisdicionalizado e de natureza subjectiva, quer o particular, quer a Administração são partes que, perante um juiz, defendem as suas pretensões, por um lado a afirmação da lesão de um direito, por outro a defesa da legalidade e do interesse público. Com efeito, tanto o particular como a Administração se encontram na mesma posição e ambos devem colaborar com o juiz para que a justiça seja prosseguida. Os deveres e poderes processuais das partes são destinados à tutela das posições jurídicas de vantagem substantivas dos particulares e da Administração que integram a relação jurídica administrativa, que é o objecto do processo.
O CPTA consagra expressamente que o particular e a Administração são partes no processo administrativo, como também consagra o princípio da igualdade efectiva da sua participação processual (art. 6º CPTA). Deste modo, afasta definitivamente as últimas expressões do modelo objectivista do “processo ao acto”. A propósito da igualdade das partes, o CPTA consagra no seu art. 8º o princípio da cooperação e da boa fé processual.
Esta ideia de que o processo administrativo é um processo de partes está também subjacente às regras comuns sobre legitimidade – art. 9º CPTA. A legitimidade enquanto pressuposto processual relativo aos sujeitos encontra-se indissociavelmente ligada aos problemas da qualidade de parte. De acordo com os cânones clássicos, a legitimidade era o critério de acesso ao juiz e esta era determinada em razão do interesse directo, pessoal e legitimo dos particulares no afastamento do acto administrativo da ordem jurídica. Os requisitos do interesse ser pessoal e legítimo não se referem apenas à relação processual, mas sobretudo apontam para a relação jurídica material. Isto dava origem a um paradoxo da concepção clássica do Contencioso Administrativo. Isto porque, por um lado recusava-se que o particular fizesse valer um direito no recurso, por outro lado os requisitos que a jurisprudência e a doutrina exigiam para a determinação do interesse processual apontavam para a sua substancialização.

No entanto, no CPTA o regime jurídico é bem diferente, e actualmente determina-se que a legitimidade decorre da alegação da posição de parte na relação material controvertida (art. 9ºCPTA). O critério é o da atribuição da legitimidade, em razão da posição dos sujeitos e da alegação de direitos e deveres recíproco na relação jurídica substantiva. Isto significa que temos de adoptar uma noção adequada da legitimidade no Contencioso Administrativo, que tem de ser destinada a assegurar a ligação entre a relação material substantiva e a relação processual, fazendo com que os participantes no processo sejam os sujeitos efectivos da relação material.

Conseguimos ver através desta exposição que quer para a determinação do processo administrativo, quer para a questão da determinação da legitimidade processual, varia consoante se esteja a falar do que acontece actualmente ou do que acontecia aquando do modelo francês e dos cânones clássicos.

Cátia Sofia Teixeira
Turma 3 – nº 15406

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