quarta-feira, 5 de maio de 2010

Observatório da realidade: Prédio em vez de torres na marginal junto à Arrábida (anulação de indeferimento?)

Em vez de cinco torres, o terreno na Rua do Ouro, junto à Ponte da Arrábida, no Porto, poderá acolher um edifício de habitação e de comércio com oito pisos. Depois de o tribunal ter aberto a hipótese de construção naquele lote, entrou um novo projecto na Câmara.
O terreno já pertenceu à Imoloc. Fica contíguo à parcela da antiga cimenteira Secil, demolida em 2006, onde está a ser construído um edifício de oito andares com 70 habitações, de autoria do arquitecto Rogério Cavaca.
A propriedade foi usada como parque de estacionamento improvisado até ser vedada pelos donos. Mudou de mãos há poucos meses. Foi vendida pela Médio e Longo Prazo (a sociedade assumiu os créditos da Imoloc) e o novo proprietário apresentou, a 5 de Fevereiro deste ano, um pedido de licenciamento de um prédio de habitação e comércio na Câmara.
O JN apurou que o projecto será semelhante, no que toca a cérceas, ao que está a ser edificado no terreno contíguo, deixando definitivamente de lado o desenho das Casas de Rio, que previa torres de 12 pisos. Apesar do actual Plano Director Municipal do Porto ter classificado o lote como área verde e de protecção de espaços naturais (o que inviabilizaria qualquer construção naquele local), os privados podem ter direitos adquiridos num processo que data do tempo do último presidente socialista da Autarquia, Nuno Cardoso.
A Imoloc entregou um pedido de informação prévia a 29 de Março de 2001 na Câmara. A solução urbanística nunca foi consensual no seio do Município. A 4 de Janeiro de 2002, obteve a opinião desfavorável da Comissão Municipal de Defesa do Património. No entanto, três dias depois, o Gabinete de Avaliação de Projectos Estratégicos (o GAPE, extinto por Rui Rio, analisava as principais operações urbanísticas para a cidade) emitiu um parecer favorável ao pedido da Imoloc. No mesmo dia, Nuno Cardoso assinou um despacho, discordando da posição da Comissão Municipal de Defesa do Património, mas deixando a decisão de licenciamento para o novo Executivo. A essa data, Rui Rio já tinha sido eleito para o primeiro mandato.
Perante o silêncio municipal, a Imoloc requereu o deferimento tácito do projecto a 9 de Janeiro de 2002 e, três meses depois, fez um aditamento ao pedido para melhorar o desenho. O então vereador do Urbanismo, Ricardo Figueiredo, indeferiu-o. Seguiu-se um litígio judicial. A última batalha foi ganha pela Imoloc, que defendia o direito de construção de 17 mil metros quadrados na Rua do Ouro e requeria a anulação dos indeferimentos de Ricardo Figueiredo. O Supremo Tribunal Administrativo considerou nula a sentença da primeira instância em Fevereiro de 2009, abrindo a porta à construção no terreno na marginal ribeirinha do Porto.Não foi possível apurar, ontem, junto da Câmara, em que fase de apreciação está o novo projecto. No entanto, o PS opõe-se à urbanização daquela parcela. Na reunião do Executivo de ontem, os vereadores socialistas estranharam a existência de um pedido de informação prévia para uma área "que sempre foi usada como sendo do domínio público" e pediram "rigor" na análise do processo. Os autarcas estão preocupados com a "proliferação de empreendimentos nas encostas do rio Douro, por vezes com índices de construção que parecem manifestamente excessivos".

Fonte: JN

Questão interessante que esta notícia suscita é a de ter sido requerida a "anulação dos indeferimentos", uma vez que, com o "novo contencioso administrativo, a via adequada para reagir contra situações de recusa (ou omissão) ilegal da prática de actos administrativos é a dedução de um pedido de condenação da Administração à prática do acto pretendido.", conforme o Prof. Mário Aroso de Almeida conclui, também com base nas soluções consagradas no artigo 67º/1 b) e c) e, ainda, no artigo 66º/2 do CPTA.
Para que haja lugar ao processo de impugnação de actos administrativos, os actos devem ter um conteúdo positivo, isto é, devem compreender um conteúdo que não consista apenas na simples recusa de introduzir modificações jurídicas que tenham sido requeridas. Aliás, dispõe, ainda, o artigo 51º/4 do CPTA que caso seja deduzido um pedido de anulação contra um acto de indeferimento, o Tribunal convida o autor a substituir a petição para que seja formulado o respectivo pedido de condenação à prática do acto devido.
Esta será uma questão a ser discutida com maior profundidade numa próxima participação já que abrange a matéria relativa à impugnação de actos admnistrativos e à condenação à prática de acto devido. Fica, para já, a notícia para reflexão.

Alexandra Guerra, nº 16179 A3

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