sexta-feira, 21 de maio de 2010

Processos de Massa - o artigo 48.º CPTA


Processos de Massa


A massificação das relações Administração-Particulares levou a um sobrecarregamento dos tribunais de pedidos idênticos que mereciam tratamento idêntico. São interesses individuais que corresponde a pretensões particulares similares. Esta situação foi recorrente em ralação ao funcionalismo público como relembra Vieira de Andrade. Deste modo, o legislador criou vários mecanismos visando a agilizarão do contencioso e uma tutela em tempo útil. Trataremos, em especial, do caso plasmado no artigo 48.º CPTA.


Como soluções processuais para a tutela deste tipo de interesses temos: o artigo 48.º CPTA (sobre o qual nos debruçamos), mecanismo que pretende fazer face a processos já instaurados; o artigo 161.º CPTA que prevê a extensão dos efeitos de uma sentença a casos idênticos; a acção popular, prevista pela Lei 83/95 que permite a defesa de interesses difusos.


Em contraposição, encontramos a apensação de processos, em que os processos mantêm a sua individualidade, havendo, contudo, tramitação comum. Para que esta suceda, existe cumulação de pedidos ou coligação das partes. A apensação não pretende solucionar os problemas dos processos em massa, ainda que torne o processo mais célere.


Existe também a fundamentação sumária da decisão, constante do artigo 94.º/3 CPTA.


É no artigo 48.º que está a resposta para a problemática deste tipo de processos. Procede-se, com base em certos critérios, à escolha de um só processo que tramitará até à decisão final. Os restantes são suspensos. O processo-modelo deverá ser o mais amplo possível, contento todas as questões de facto e direito alegadas nos vários processos, por razões de garantia.


A nível de Direito Comparado, esta solução tem tido grande acolhimento. É geral o esforço em encontrar mecanismos de tutela conjunta de interesses. No Brasil, tutelam-se interesses individuais homogéneos, tendo os efeitos da decisão, eficácia erga omnes ou ultra partes, dependendo dos casos. Nos EUA, as class actions permitem a tutela de interesses individuais homogéneos. Na Itália e Espanha, há a possibilidade de extensão dos efeitos da sentença a quem se encontre na mesma situação jurídica material. Em Espanha, há mesmo a selecção de um ou alguns processos para tramitação preferencial, a par da suspensão dos restantes. Por fim, na Alemanha, existe um mecanismo de escolha de um processo-modelo, com suspensão dos demais, sendo que há extensão dos efeitos do caso julgado aos últimos. Daqui podemos inferir que Portugal sofreu uma grande influência espanhola e alemã no tocante aos processos de massa.


Mergulhemos agora mais profundamente neste instituto.


O mecanismo presente no artigo 48.º CPTA é reactivo, e não preventivo, dado que tenta juntar processos já interpostos. Este serve, como já referido, a economia processual. Não obstante, há que salvaguardar as garantias do particular. Para tal, vejamos os requisitos de aplicação do artigo 48.ºCPTA.


Primeiramente, tem de haver um conjunto mínimo de 20 processos. Este pressuposto visa justificar a suspensão dos processos, mediante um número mínimo razoavelmente alargado. Em segundo lugar, têm de haver diferentes pronúncias da mesma entidade administrativa. Aqui, o legislador quis alargar o âmbito do mecanismo, não restringindo o seu despoletar perante pronúncia distintas da mesma entidade, sendo que a agregação e eventual restrição compete aos outros pressupostos. Como terceiro requisito, temos a mesma relação material, perante o qual se detectam processos em massa. Por mesma relação jurídica material, devemos entender aquela em que encontremos os mesmos tipos de poderes ou restrições conferidas à Administração Pública ou os mesmos direitos e deveres atribuídos aos particulares perante aquela. A compreensão desta poderá ser feita através da análise dos actos administrativos que criam, modificam ou extinguem as relações. Em quarto lugar, a susceptibilidade de decisão com base na aplicação das mesmas normas a idênticas situações de facto. O que se pretende é atingir relações materiais que, embora não tenham os mesmos direitos e deveres do particular e Administração, convoquem as mesmas normas jurídicas para uma mesma situação de facto. É através do preenchimento destes requisitos, que o instituto ancora a sua legitimidade e validade, garantindo coerência e homogeneidade.


Quanto à tramitação, é ao juiz presidente que cabe desencadear este mecanismo uma vez que tem uma visão abrangente dos processos pendentes. Antes de tomada esta decisão, as partes devem ser ouvidas, devendo o tribunal considerar seus argumentos, nomeadamente as partes dos processos a serem suspensos. Feito isto, o juiz decide qual ou quais os processos continuarão. Sendo vários, estes são apensados. Para escolher o processo-modelo, o juiz deverá preferir o que oferecer maiores garantias de existir um tratamento global das questões colocadas nos vários processos. Os processos não seleccionados são suspensos, o que constitui a originalidade deste mecanismo em face da apensação. A tramitação está sujeita ao regime previsto para os processos urgentes nos termos do artigo 48.º/4 CPTA e na decisão devem intervir todos os juízes para que seja uma decisão assumida por todos e bem fundamentada, criando uma jurisprudência sedimentada, ensinam Freitas do Amaral e Mário Aroso de Almeida. O artigo 48.º/3 CPTA pretende garantir a justiça, segurança e coesão do processo de massas.


A sentença final não limita os direitos das partes dos processos suspensos que podem desistir do processo, requerer a extensão ao seu caso, recorrer da sentença ou até requerer a continuação do próprio processo.


Trata-se de um instituto exótico, não muito estudado, que considerei interessante.



Maria Teresa Ferreira

Subturma 3

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