segunda-feira, 3 de maio de 2010

analise ao Ac. STA 0701/09 de 11/03/2010

Vem o Ac. STA de 11-03-2010, processo 0701/09, nos dizer que o art. 51º, n.º1 do CPTA, introduziu um novo paradigma de impugnação contenciosa de actos administrativos lesivos, que convive com a existência de impugnações administrativas necessárias, não só quando a lei o disser expressamente, como também em todos aqueles casos, anteriores à vigência do CPTA, que contemplavam impugnações administrativas, previstas na lei, como necessárias. Sendo assim inaplicável este preceito sempre que houver determinação legal expressa que preveja a necessidade de impugnação administrativa como pressuposto da impugnação contenciosa.
O art.51.º, n.º1, acabou com o princípio de que o acto deveria ser verticalmente definitivo, ou seja, de que para recorrer ao contencioso administrativo não era preciso esgotar os meios de recurso, art.59.º, n.º4, vem assim a tirar a força do art.167.º CPA, quanto a divisão entre recursos necessários e facultativos, uma vez que passam a ser todos facultativos. No entanto, quando há possibilidade de uma lei especial prever um recurso hierárquico necessário em derrogação ao regime geral tem-se discutido na doutrina se o mesmo será inconstitucional por restrição ilegítima de um direito fundamental, art. 18.º CRP. Contudo parece de apoiar a solução de que esta restrição à impugnação contenciosa, com obrigatoriedade de esgotamento de meios graciosos, não contraria o art.268.º, n.º4, CRP, salvo nos casos em que o percurso legal imposto para alcançar a via contenciosa suprima ou restrinja intoleravelmente o direito de acesso ao tribunal ou prejudique desproporcionada ou arbitrariamente a protecção judicial efectiva dos cidadãos, uma vez que o recurso hierárquico necessário tem sempre o efeito suspensivo dos actos lesivos praticados, para além do seu efeito “prático”, uma vez que é mais informal, com menos custos e obriga uma autoridade administrativa mais qualificada a pronunciar-se sobre o caso.
No caso em apreço, há no entanto uma restrição inconstitucional ao direito de impugnar judicialmente o acto, se o tribunal tivesse concluído da interpretação dos arts.28.º e 29.º da Lei n.º10/94 (SIADAP) que, para além da reclamação necessária, estaríamos ainda perante um recurso hierárquico necessário. Embora no caso apenas se discute se a mesma é uma reclamação facultativa ou necessária, assim vem o Ac.STA considerar que estamos perante uma reclamação necessária compatível com o art.51.º, n.º1, com dois argumentos centrais: dizendo que a Lei n.º10/2004, que o SIADAP regulamenta, dispõe no sentido inverso embora não se pronunciando directamente sobre a natureza desta reclamação, bem como o facto de o art.51.º, n.º1, CPTA, não ter revogado as normas existentes em diplomas avulsos que previssem, em termos expressos, a existência de reclamações graciosas em determinados procedimentos.
Para concluir não podemos dizer que o art. 51.º, n.º 1 CPTA não revogou as impugnações administrativas necessárias constantes de leis avulsas, contudo houve uma alteração relevante na ordem jurídica com a introdução deste novo paradigma em conjugação com a alteração constitucional do art. 284.º, n.º 4 CRP em 1989 e também porque a reclamação necessária é uma restrição a um direito fundamental, deve por isso ser interpretada no sentido menos restritivo possível para os particulares lesados, o que no caso em apreço levanta sérias dúvidas, uma vez que parece que se optou pela interpretação mais gravosa dos direitos dos particulares.

Ricardo Celorinda Luís, nº 16345, subturma 3

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